Olá, meu nome é Alan Kenneth, sou criador do Sentindo Filosofia. Sou estudante de 7° período de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Criado no dia 12 de outubro de 2008, o Sentindo Filosofia tem por objetivo defender a idéia de um saber subjetivo, onde o sujeito em sua individualidade existencial, cria suas concepções da realidade, assim sucessivamente, começa a atribuir sentido ao mundo e ao universo tendo como referencial a sua própria realidade enquanto ser no mundo.

Roberto Caldeira Flores, é um dos colaboradores do Sentindo Filosofia, estudante do 7° período de Filosofia da Pontifica universidade católica de minas Gerais.

domingo, 18 de abril de 2010

Sartre: A Liberdade Enquanto Responsabilidade e a Necessidade do Olhar do Outro para Identificação do Eu

É através do olhar que nos identificamos, é através do olhar do outro e do outrem que me vejo diante de um mundo e percebo quem sou e como sou. É nesta perspectiva que a filosofia existencialista sartriana trilha. Devemos entender que embora exista uma relação com cogito cartesiano, enquanto possibilidade de apreensão da realidade, é de suma importância que entendamos que ao apreender a existência subjetiva, apreendamos também a existência de outrem:
Porém, a subjetividade que alcançamos a título de verdade não é uma subjetividade rigorosamente individual, visto que, como já demonstramos, no cogito eu não descubro apenas a mim mesmo, mas também os outros. Através do penso, contrariamente à filosofia de Descartes, contrariamente a filosofia de Kant, nós nos apreendemos a nós mesmos perante o outro, e o outro é tão verdadeiro para nós quanto nós mesmos. Assim, o homem que se alcança diretamente pelo cogito descobre também todos os outros, e descobre-os como sendo a própria condição de sua existência.
(SARTRE, 1987, p. 15)
Jean Paul Sartre em sua conferência O Existencialismo é um Humanismo, busca explicitar toda a sua teoria existencialista, alvo de críticas após a publicação de Ser e o Nada. Ao contrário da segunda, que tem um caráter de profundidade e possui termos e conceitos mais complexos, o Existencialismo é um Humanismo busca demonstrar de forma mais simples o que fora tratado em O Ser e o Nada, de tal forma que qualquer pessoa possa compreender sua filosofia.
O ponto de partida para a compreensão da filosofia existencialista é pensar na existência enquanto única possibilidade inicial do homem: A existência precede a essência com dito pelo próprio Sartre. Sartre, sendo ateu, pensa que não existe nada anterior a existência - um ser onipotente que ao nos criar, produz várias concepções a priori e a partir disso, através destas “categorias a priori” nos relacionamos com o mundo. Para Sartre, somos um nada, que se constitui a partir de sua existência, se formando a partir das relações, humanas, e das relações do homem com o mundo.
O homem, tal como o existencialista o concebe, só não é passível de uma definição porque, de inicio não é nada: só posteriormente será alguma coisa e será aquilo que ele fizer de si mesmo. Assim, não existe natureza humana, já que não existe um Deus para concebê-la. (SARTRE, 1987, p. 6)
O homem antes de mais nada existe, e partir daí este se molda, este não é nada mais do que o que ele faz consigo mesmo, é isto que Sartre coloca como sendo sua subjetividade. A subjetividade em Sartre - diferente da subjetividade que críticos apontam como sendo a negação do mundo - é a capacidade do sujeito se formar, a partir de se mesmo, pois não há alternativa de completude a não ser a que o próprio eu se completa. Este, ao se formar, se projeta para o futuro, e tem consciência de seu projetar.
[...] o homem, antes de mais nada, existe, ou seja, o homem é, antes de mais nada, aquilo que se projeta num futuro, e que tem consciência de estar se projetando no futuro. De inicio, o homem é um projeto que se vive a si mesmo subjetivamente ao invés de musgo, podridão ou couve-flor; nada existe antes desse projeto; não há nenhuma inteligibilidade no céu, e o homem será apenas o que ele projetou ser. (Sartre, 1987, p. 6)
Mas ao dizer que somos aquilo que nos projetamos ser, não é no sentindo de querer, mas sim no âmbito da vontade, como algo mais profundo e espontâneo: quero me casar, fazer tal faculdade etc. e pensando nesta perspectiva, assim como a negação de uma ordenação divina que precede a existência, o homem é total responsável pela sua existência enquanto tal. Porém, o homem não é só responsável por si próprio, mas sim por todo o homem, quero dizer por toda humanidade.
A subjetividade para o existencialismo seria a incapacidade do homem de transpor os limites da própria subjetividade humana e não como pensam os críticos, em um individualismo narcísico. Pois ao escolher-mos, estaremos escolhendo também o outrem. Pois toda escolha profere um valor, e neste âmbito, ao escolhermos para nós, proferiremos tal valor que desencadeará no outro, lembrando que para Sartre a escolha não desemboca no mal, será sempre para um bem, e não existe bem solo, o bem sempre remeterá num todo.
Escolher ser isto ou aquilo é afirmar, concomitantemente, o valor do que estamos escolhendo, pois não podemos nunca escolher o mal; o que escolhermos é sempre o bem e nada pode ser bom para nós sem o ser para todos. (SARTRE, 1987, p. 7)
Quando o homem adere ao tal partido, ou busca o matrimonio, este faz escolhas individuais, mas ao escolhê-las, escolhe também valores que cabem a cada um, e, desta forma, assumindo estes valores, também transportará estes valores para a humanidade. Ao engajar em tal modalidade, o homem resigna tal coisa a tal humanidade. Desta forma fica claro que para Sartre, as escolhas feitas pelo homem tem total responsabilidade, pois não se trata apenas de sua vida, e sim da vida de toda a humanidade. Quando o homem entende sua responsabilidade para com o mundo, ele se angustia.
Para Sartre, o homem é angústia. O homem que se engaja, e ao se engajar tem a consciência de que seu engajamento não é apenas uma escolha que o forma, mas sim um escolha legisladora que também engajará toda a humanidade, e se angustiará ao perceber toda a responsabilidade presente em sua escolha.
Porém, o que ocorre na maioria da vezes é o mascaramento da responsabilidade, onde o sujeito, pensa, ou pelo menos procura pensar que suas escolhas não interferem no mundo, e somente a sua vida em particular, este isola-se do mundo, vive somente aquilo que pensa ser o que é, negando sua responsabilidade para com o mundo; isto é o que Sartre chama de má fé.
Aquele que mente e que se desculpa dizendo: nem todo mundo faz o mesmo, é alguém que não está em paz com sua consciência, pois o fato de mentir implica um valor universal atribuído à mentira. Mesmo quando ela se disfarça, a angústia aparece.
(Sartre, 1987, p. 7)
A angústia é o sentimento que mostra a responsabilidade do homem para com o mundo, pois este sabe quão importante é suas escolhas, e que esta influencia todo o universo humano.
O homem, após existir, não terá nenhuma referencia para onde ir, já que não existem como dito antes, idéias inatas presentes, e sendo um nada que ainda vai se constituir, este é responsável por sua criação, está só – em termos de existência transcendente – e por isso tem que se construir. “O homem está condenado a ser livre [...] (SARTRE, 1987, p.9)”, esta máxima sartriana quer dizer que o homem não criou a si próprio e por isso é condenado e livre porque a partir da sua existência este é responsável por sua construção, e que a própria liberdade leva a responsabilidade de escolher para o mundo. A partir da liberdade que o homem inventa o homem. Para o existencialismo, o homem se constrói a todo instante, então não pode existir a concepção de que o homem já nasce herói ou covarde, isto acontecerá a partir de suas escolhas, e não a partir de seu código genético, ou de uma ordem divina.
Por fim, entende-se que a existência precede a essência, porém esta existência ainda é como o nada, e por causa disso o homem está condenado a ser livre, pois este que será o responsável pela construção do próprio eu, mas não somente o próprio eu, também pela construção de todos os homens, assim já percebemos que existe neste principio uma relação do eu com outro, e mesmo sendo uma busca do cogito, se difere porque já inclui a existência de outrem. Porém, mesmo sendo o homem que constitui o próprio homem, devemos entender que é somente no outro que percebo quem sou. É através do olhar do outro – como dito no inicio – que me vejo, pois o outro é tudo aquilo que não sou. “[...] cada um escolhe perante os outros e se escolhe perante os outros. (SARTRE, 1987, p. 18). Sartre diz (p.16) que o outro é indispensável à minha existência tanto quanto, aliás, ao conhecimento que tenho de mim mesmo. Ele diz que a descoberta de minha intimidade se dá em função de uma liberdade, a do outro que se encontra em minha frente, e este que pensa e que quer, somente a favor e/ou contra mim. Sartre afirma que este plano das relações entre o eu e o outro/outrem pode ser entendido como intersubjetividade.
O homem é livre, porém esta liberdade trás consigo a responsabilidade, e a responsabilidade a angústia, pois a escolha que faço, é plenamente livre, mas ao escolher para mim, também escolho para o mundo, e, não sou o responsável por minha existência, mas sou responsável por minha constituição, e que por mais que eu me constitua, necessito do outro para compreender o que sou como também sou responsável pela identificação que outro terá através de mim.


Referências

Sartre, Jean-Paul. O Existencialismo é um Humanismo. In: Os Pensadores. 3.ed. São Paulo: Nova Cultural. 1987, p. 1-32.

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